sábado, 11 de abril de 2009

Fontes do Direito Civil.

Necessário é primeiramente distinguir o significado da palavra fonte que assim como várias outras na Ciência Jurídica apresenta caráter equívoco. Possui o vocábulo supracitado, dupla significação, podendo querer referir-se tanto ao sujeito do qual emana a legitimidade de elaboração das normas, quanto às variadas formas de manifestação da vontade jurídica.

Pode-se então afirmar que há duas espécies de fonte do direito civil: a fonte de conhecimento e a fonte de produção. Esta é atributo e competência privativa da União, conforme assevera o art. 22 da CF/88 que “compete privativamente à União legislar sobre direito civil”. Aquela se subdivide em fontes imediatas, aceitas majoritariamente pela doutrina como a lei e os costumes, e as mediatas que são a própria doutrina e a jurisprudência.

A lei é a principal forma de produção e conhecimento do Direito Civil. Pode ser definida como uma regra geral e abstrata, dotada de poder coercitivo, produzida por autoridade competente e de forma escrita. Geral, pois, é dirigida a toda a coletividade ou um número indeterminado de pessoas. Abstrata porque o legislador ao elaborá-la tenta prever condutas sociais futuras sendo aplicada a todas as situações concretas que incidir. Deve emanar de poder competente o qual será designado pela Constituição, cabendo em regra geral ao Poder Legislativo. No que tange à imperatividade da lei, é da tradição dizê-la como decorrente dos princípios de justiça e do poder do legislador. A lei é apresentada por uma fórmula escrita, em geral, imperativa e categórica, residindo na escrita a diferença básica do sistema romanístico com relação ao direito costumeiro. O novel ordenamento civilista é a lei principal para o Direito Civil, porém, há outras leis que servem de subsídio a esse código como a Lei do Divórcio e a Lei do Inquilinato.

De acordo com a opinião de alguns autores, haveria uma lei natural, imanente ao Direito, pela qual os sistemas jurídicos deixariam a sua forma consuetudinária e se transformariam, progressivamente, em Direito codificado. Para Icílio Vanni , duas formas psicológicas concorrem para a formação dos costumes: a imitação e o hábito. Este, o qual ele chama de segunda natureza humana, é regulado pela lei da inércia, que induz ao homem a repetição de um ato pela forma já conhecida empiricamente. Aquele corresponderia a uma tendência natural dos seres humanos de copiar os modelos adotados por outros ao revelarem-se úteis.

A doutrina ou Direito Científico, é o trabalho científico dos juristas, dos estudiosos do Direito, composto de teorias desenvolvidas por esses com o escopo de sistematizar e interpretar as normas vigentes. Também é chamada de communis opinio doctorum. Esta se revela fecunda em três direções: como atividade criadora, crítica e com função prática. Criadora porque é a doutrina que introduz os neologismos, os novos conceitos, teorias e institutos no mundo jurídico. Atividade crítica, pois submete o jus positum a juízos de valor, a uma plena avaliação, sob diferentes ângulos de enfoque, acusando suas falhas, deficiência e mostrando possíveis soluções. A fim de estudar as normas vigentes, o jurista sistematiza o Direito, desenvolvendo seu trabalho de interpretação, revelação de seu sentido e alcance, sendo esta a função prática da doutrina.

E por fim, tem-se a jurisprudência. Na antiga Roma este vocábulo foi utilizado a fim de designar a Ciência do Direito e era definido como Divinarum atque humarum rerum notitia, justi atque injusti scientia. Esta concepção realça a essencial qualidade do jurista: a prudência. Nesse sentido entende Reale que tudo deva ser feito para manter o sentido original do vocábulo.

Hodiernamente, a palavra possui uma acepção stricto sensu, indicando a doutrina que se vai firmando através de uma sucessão convergente e coincidente de decisões judiciais ou de resoluções administrativas. É então a revelação do direito que se processa através do exercício da jurisdição, em virtude de uma sucessão harmônica de decisões dos tribunais. Todas essas fontes, junto com os princípios gerais do direito são utilizadas em caso de omissão da lei civil, regulamentadas no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil.

REFERÊNCIAS:
VANNI, Icílio. Lições de Filosofia do Direito. São Paulo: Pocai Weiss & CIA, 1916. 2 ed. Pg. 50.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 2008. 28 ed. Pg. 62.

Escrito por Diego Carmo, estudante de direito da UESC

STF decide quem deve ser autor da ação por estupro se o MP ou a Defensoria

Por Lilian Matsuura e David Prado

O Supremo Tribunal Federal está diante de uma tese ousada. A defesa de dois acusados de estupro pede a liberdade e a anulação da Ação Penal com base no argumento de que o Ministério Público não poderia ter apresentado a ação em nome da vítima, por mais que ela tenha alegado pobreza. Para a advogada Carla Rahal, que defende os acusados, cabia à Defensoria Pública entrar com a ação. O julgamento do Habeas Corpus foi adiado no dia 6 de março, por pedido de vista do ministro Marco Aurélio. Por enquanto, existem seis votos contra a tese da advogada.

O artigo 225 do Código Penal, em vigor há 69 anos, prevê que, em casos de vítimas de estupro que não podem pagar as despesas do processo, será proposta Ação Penal pública condicionada, de autoria do Ministério Público Estadual. Quando foi aprovado o Código Penal, entretanto, ainda não havia sido criada a Defensoria Pública no país, que só surgiu 44 anos depois, com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Por isso, a advogada dos réus afirma que esse dispositivo do CP não foi recepcionado pela Constituição. A Defensoria, que existe para atuar pela população de baixa renda, deveria ter sido a autora da ação contra os seus clientes, sustentou Carla Rahal no HC (clique aqui para ler). Em São Paulo, a Defensoria foi criada em 2006.

Para reforçar a sua tese, ressaltou em seu pedido que o Código de Processo Penal, de 1941, em seu artigo 32, diz que, “nos crimes de ação privada, o juiz, a requerimento da parte que comprovar a sua pobreza, nomeará advogado para promover a ação penal”. Outra estratégia da defesa foi apresentar um levantamento histórico no qual relaciona a trajetória da legislação criminal desde 1830. “Sempre na legislação brasileira, houve uma tradição em tratar os crimes sexuais como uma iniciativa privada”, conta Carla.

Por enquanto, os ministros não entendem que a criação da Defensoria Pública possa ter restringido a legitimidade do Ministério Público para propor Ação Penal nos crimes contra os costumes. O relator, ministro Ricardo Lewandowski, reafirmou a legitimidade do artigo 225 do Código Penal. Doi seguido pelos ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Eros Grau, Joaquim Barbosa e Carlos Britto.

Em abril de 2007, a 2ª Turma do Supremo, por unanimidade, concluiu que os crimes de estupro e atentado violento ao pudor são passíveis de proposta de Ação Penal pelo Ministério Público, mesmo nos casos em que a vítima se declare pobre e conte com assistência jurídica gratuita. Para isso, basta que manifeste sua intenção de processar o acusado. O ministro Joaquim Barbosa foi o relator do RHC 88.143.

A advogada Carla Rahal critica a manifestação dos ministros no HC apresentado por ela. “O relator se limitou a dizer que já existe um precedente e todos acompanharam o voto do relator.” Para ela, o entendimento do STF sobre o assunto lhe trouxe um sentimento de desapontamento em relação à Justiça no país. “Os fundamentos são tão absurdos que demonstram uma inaptidão, uma vontade, por vezes, de exercer o não-direito. Isso decepciona”, lamentou.

Em relação à expectativa do voto do ministro Marco Aurélio Melo, a advogada é otimista. “É nítida a legitimidade da Defensoria Pública para isso. Eu espero que ele (ministro Marco Aurélio) consiga fazer com que os demais revejam os seus votos.”

Pública ou privada

O criminalista Alberto Zacharias Toron não concorda com a tese da advogada. “Tradicionalmente, quem sempre propôs a ação nesses casos foi o Ministério Público. Não me parece que a criação da Defensoria retire a atribuição do Ministério Público”, entende. Para o advogado, o artigo 225 do CP foi recepcionado pela Constituição e foi aplicado durante os últimos 20 anos.

Já o defensor público do Rio de Janeiro Denis Praça entende que o dispositivo não foi recepcionado. Para ele, a criação da Defensoria Pública acabou com a competência do Ministério Público para propor esse tipo de Ação Penal. “Em 1988, a Constituição Federal cria uma instituição para atender a população carente. Por isso, esse dispositivo do CP perde o sentido.”

A sua principal preocupação, diz, é em relação ao sofrimento da vítima. Durante o processo, a vítima revive toda a situação, por meio do depoimento, do exame de corpo de delito, das audiências com o juiz, conta o defensor. Na Ação Penal pública, movida pelo Ministério Público, ela não tem a possibilidade de desistir do processo. Na ação privada, a vítima tem essa escolha. “Se o Supremo manter o seu posicionamento, vai tirar o direito da vítima pobre de desistir do processo. O que é um sofrimento. Quem puder pagar advogado para se defender, vai ter esse direito.” Para Denis Praça, o Supremo deveria decidir no sentido de que o dispositivo não foi recepcionado e, portanto, a competência é da Defensoria Pública.

HC 92.932

Fonte: http://www.conjur.com.br/2009-abr-11/stf-decide-acao-estupro-autoria-mp-ou-defensoria